Recordar Agustina Bessa-Luís

SOLDADO ROMANO.

A obra “O Soldado Romano” de Agustina Bessa-Luís é um conto infanto-juvenil, publicado em 2004 pela editora Ambar, com belíssimas ilustrações de Chico (Francisco Cunha), ilustrador natural de Vila do Conde.

Nesta obra de caráter autobiográfico, a autora, entre a memória e a ficção, lança um olhar retrospetivo sobre a sua infância e o tempo em que passava férias, durante quinze dias, no mês de setembro, na Quinta de Cavaleiros.

Ao saborear as palavras da autora, e à medida que folheamos o livro, sente-se que estas terras de Bagunte e de Outeiro Maior, já referenciadas anteriormente noutras obras, eram lugares de sonho e de liberdade. Alimentaram o imaginário de Agustina e rechearam a sua memória de momentos muito felizes, vividos com o irmão, a mãe, os primos, especialmente a prima Alice, com os amigos do irmão que vinham da Póvoa de bicicleta, com o seu tio António, … e com as pessoas naturais destas terras.

De acordo com a descrição de Agustina, “Cavaleiros era (…) uma terra fechada noutra época, como se tivesse à volta um muro alto coberto de hera (…). Em tempos muito antigos, Cavaleiros pertencia a um condado mais importante do que o Condado Portucalense. Tinha florestas onde ainda havia ursos (…). O que ainda era uma amostra desses tempos era a casa” onde vivia durante o período de férias: a casa de Cavaleiros.

Na casa de Cavaleiros, “no terreiro, atrás da casa, havia uma nogueira tão grande que enchia cem cestos de nozes e tinha uma varanda com doze colunas de pedra voltada para os campos”. Apesar de Agustina gostar muito de estar nesta casa, reconhece que não era, propriamente, “um lugar bom para tranquilizar ninguém”, muito menos os medrosos, como o seu irmão. “Tinha alçapões tanto nas salas como nos corredores e que comunicavam com as adegas e as cortes de gado. De dia e de noite ouviam-se os cifres dos bois bater no sobrado”.

Agustina recorda, também, o passeio ao Monte da Cividade, que ficava ao pé da aldeia de Corvos. Corvos chamava-se, assim, “porque bandos de corvos pretos como carvão voavam em volta e pareciam trazer notícias de alguma parte com os gritos que davam”. 

No Monte da Cividade, lugar que “tinha sido um quartel de romanos e havia lá ruínas que eram a prova disso” (…) viveu muitas aventuras, dominadas pela imaginação e pelo medo. Agustina refere que tanto a Cividade, como a casa de Cavaleiros, eram locais fabulosos para amedrontar o irmão. No vasto silêncio da Cividade, qualquer barulhinho provocava inquietação e, de facto, “havia barulhos infinitos, vinham de muito longe. Até se podiam ouvir os romanos a marchar e as couraças deles a ranger”. Com o medo o seu irmão ficava “branco como um lençol”, com “uma cara apavorada” e sempre que Agustina lhe falava do “soldado romano que devia ter estado há muito tempo no monte da Cividade” ele não conseguia disfarçar o temor. O soldado romano, o “Centurião”, que era um homem baixo com as “pernas tortas de andar a cavalo”, está presente em  toda a obra.

O passeio à Senhora das Neves era também muito apreciado. A Capela de Nossa Senhora das Neves que “estava à beira de uma floresta que pertencia à Quinta de Cavaleiros”, propriedade do pai de Agustina Bessa-Luís, era para Agustina “uma ermida do mais bonito que se imagina”. Nesta obra, a autora faz referência ao desaparecimento da imagem de Nossa Senhora das Neves: “Roubaram-na, e isso fez muita impressão a toda a gente”.

Quanto às brincadeiras, havia uma grande diferença entre as dos rapazes e as das raparigas. Agustina considerava que eles fazem “coisas que não têm jeito nenhum”. Refere-se, por exemplo, às apostas que constantemente faziam, ao estarem sempre a medir forças, às caçadas, ao facto de gostarem de armas e de relógios, de fazerem jogos perigosos, de andarem de bicicleta e acabarem, muitas vezes, “esmurrados e com os joelhos em sangue”.

A prima Alice era a sua principal companheira das brincadeiras. Diz Agustina que as duas, em Cavaleiros, andavam todo o dia “acompanhadas de imaginações e fantasias”.

Ao logo da obra a autora faz referência a algumas pessoas que viviam em Cavaleiros e arredores: os filhos do caseiro que, por vezes, olhavam para ela e para a Alice como se fossem “doidas varridas”; as filhas do caseiro “que aqueciam os garfos de ferro no lume para frisar os cabelos (…), “tricavam hortelã para que a fala delas cheirasse bem” (…) pareciam fadas, ainda que não soubessem ler e escrever”; a Maria de Cavaleiros, “cozinheira, que trazia um cordão de ouro ao pescoço e arrecadas também de ouro nas orelhas” e que tratava muito bem a família. Agustina admirava a Maria, porque ela “trabalhava muito para cuidar da sua mãe e do seu irmão doente (…) que “nunca chegara a andar e estava na cama desde que nasceu”. Refere um pormenor que a sossegava, embora não acreditasse: quando trovejava a Maria “benzia-se muitas vezes. Ia buscar um ramo de oliveira benzido no Dia de Ramos (…) e queimava-o na lareira”, pois acreditava que afastava os trovões.

Nas suas memórias persistem cheiros e sabores daquele tempo: o cheiro a hortelã, o sabor das nozes verdes da nogueira que existia no terreiro atrás da casa e das batatas assadas na Cividade com muito sal e meias cruas.

Apesar de serem as férias de verão, estas férias eram também uma oportunidade para contactar com outras realidades e fazer novas aprendizagens. Agustina destaca que os caseiros aproveitavam a água da chuva, enchendo as pipas velhas, para fazer o sulfato para as vinhas; faziam o pão; secavam os figos em tabuleiros; coravam e espadelavam o linho, e ela acompanhava-os em algumas tarefas. Até viu nascer um vitelo e pisou uvas no lagar.

Esta obra foi apresentada por Agustina Bessa-Luís em Bagunte e Outeiro-Maior no dia 3 de março de 2005, com a presença do Ilustrador Chico e das mais altas entidades locais. Foi um dia muito feliz e memorável para todos nós.

Bibliografia:

BESSA-LUÍS, Agustina. O Soldado Romano. Porto, Editora AMBAR, 2004, 1ª ed.

Texto: Paula Viso

Fotos:

Capa do livro O Soldado Romano;

Cividade de Bagunte

Agustina Bessa Luís

Apresentação do livro O Soldado Romano, 3 de março de 2005, Bagunte

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